quarta-feira

Sonhar

Sou uma sonhadora irremediável.
Sempre fui e acho que sempre irei ser.
Desde que me conheço como gente, sempre tive um mundo só meu, dirigido e pintado por mim.
Quem me conheçe bem, sabe que são frequentes as vezes em que embarco sem dizer adeus, e, só a custo volto a pôr os pés na Terra.
Não, não utilizo o Sonho para me alheiar, iludir ou, até mesmo, para ignorar a realidade; utilizo-o antes para iluminar a trama da vida, que tão cinzenta é.
O Sonhador, quando alcança o seu pleno, é muitas vezes confundido com um louco, pois, tal como um louco, atinge um desencatamento tal, que, para continuar a viver, desprende-se da cruel realidade e cria a sua própria realidade.
Hoje em dia, sonhar é uma arte, à qual só alguns tem acesso.À velocidade que anda o mundo, é muito fácil esquecermo-nos de sonhar e mais fácil ainda, perder a razão.
O Sonho é uma espécie de ascese, que se forma em tempos difíceis, em tempos de cólera, em tempos de ócio, em tempos de paixão, em tempos de tristeza.... enfim, que se forma em qualquer situação.
A verdade, é que tem sido o Sonho e os meus valores que me tem dado o alento necessário para continuar a viver perante as agruras das vida. Ninguém disse que era fácil viver...
Através do Sonho, revelo-me da forma mais sensível e crua possível, sem nunca perder a razão, encontro justificação para o injustificável, perdão para o imperdoável.
Talvez seja o sonho que faz de mim uma boa pessoa, capaz de criar e seguir sem rancores ou amarguras. Pelo menos, gosto de pensar assim ;)
E já dizia António Gedeão, um dos grandes poetas nascidos neste berço fértil, à beira mar plantado:



(...)
Eles não sabem que o sonho
é tela, é cor, é pincel

(...)
Eles não sabem, nem sonham,
que o sonho comanda a vida,
que sempre que um homem sonha
o mundo pula e avança (....)

quinta-feira

Inconstância



Procurei o amor, que me mentiu.

Pedi à Vida mais do que ela dava;

Eterna sonhadora edificava

Meu castelo de luz que me caiu!



Tanto clarão nas trevas refulgiu,

E tanto beijo a boca me queimava!

E era o sol que os longes deslumbrava

Igual a tanto sol que me fugiu!


Passei a vida a amar e a esquecer...

Atrás do sol dum dia outro a aquecer

As brumas dos atalhos por onde ando...



E este amor que assim me vai fugindo

É igual a outro amor que vai surgindo,

Que há-de partir também... nem eu sei quando...




Florbela Espanca

Ponte




Sim. Definitivamente, sim!


Uma ponte.


É disso mesmo que eu preciso, de uma ponte.


A ponte é a passagem para uma outra margem.
Qual barqueiro, qual quê! A ponte efectiva a passagem, garante que realmente se chega lá, ignora as correntes mais fortes, vales, declives, precipícios....

A ponte? Sim, a ponte é também cenário de inúmeros mergulhos decididos para o obscuro, uns bem sucedidos, outros frustrados. "(...) Vou caminhar até à ponte. Se alguém me sorrir, não salto."

Uns utilizam-na como um final, outros, como início.

Eu, eu preciso de uma ponte sólida, que transmita segurança a cada passo que dou, já que, nem sempre tenho essa segurança em mim... Preciso de uma ponte que me leve para o lado de lá, que me deixe olhar para baixo, sem qualquer tipo de hesitação.
Seja como for, a ponte será sempre retrato de solidez.
Definitivamente, uma ponte é tudo o que preciso!